sábado, 29 de setembro de 2012


CACARECO DE GRAVATA

Luciano Ornelas

É um circo dos horrores esse desfile de candidatos a vereador na campanha
eletrônica pelo País: tem de tudo, até um Bin Laden, numa espantosa demonstração
de que nossa democracia representativa começa no grande picadeiro das eleições
municipais. Eles prometem de tudo, o que não importa – mesmo eleitos, nada
cumprirão. Nem eles nem os mais arrumadinhos, de terno, gravata e frases de efeito,
desses que parecem entender do riscado de executivo e legislativo, com promessas de
curar num passe de mágica todos os males nacionais.
Mais triste ainda é a constatação de que essa é a imagem da política brasileira
refletida no espelho. Entra-se para tirar proveito e pronto. Não há nada de sério, com as
exceções que confirmam a regra. A ordem geral é explorar a boa-fé ou a ingenuidade
do eleitor, que protesta: se assim é, o voto também não precisa ser sério. Uma vez os
paulistanos votaram em massa no rinoceronte Cacareco, então hóspede do zoológico
de São Paulo; de sua parte, os cariocas preferiram o macaco Tião – e assim Cacareco e
Tião foram elevados à condição de excelências.
Podemos comparar as figuras exóticas de hoje com as do passado recente, como
o falecido médico Enéas Carneiro ou o palhaço Tiririca. No primeiro caso, o do “Meu
Nome é Enéas”, o médico nada tinha de caricato além da careca e da barba negra:
descobriu uma fórmula de se comunicar no grito e conseguiu apelo popular pelo viés da
extravagância. Foi eleito com mais de um milhão e meio de votos. Constatou-se depois
que era um homem autoritário, histriônico defensor da bomba atômica. Enfim, mais um
espertalhão entre tantos.
Na última eleição, o Cacareco da vez foi Tiririca, eleito deputado federal com
1,35 milhão de votos válidos, um fenômeno. Pensou-se, a princípio, que era apenas
mais um oportunista, um prosaico e ingênuo palhaço profissional em busca do ótimo
salário e de todas as mordomias ofertadas pelo Congresso Nacional.
Que nada, era bem pior do que isso. A candidatura de Tiririca – em razão de sua
exposição em programas populares de tevê – foi cozinhada no fogo alto da ganância
desmedida de políticos profissionais, desses que emolduram a política com o desenho
do inferno e as cores da safadeza. O fato é que Francisco Everardo Oliveira Silva, o
Tiririca, chegou ao Congresso Nacional como a maior piada da política brasileira.
O palhaço foi “descoberto” pelo deputado federal Valdemar da Costa Neto (Boy
por apelido, filho de um ex-prefeito de Mogi das Cruzes), secretário-geral e um dos
donos do PR, Partido da República. Numa pesquisa, Boy descobriu que Tiririca poderia
ter mais de um milhão de votos e assim arrastar mais um monte de candidatos sem
votos. E sem nenhuma representação popular. Acertou na mosca.
Ou seja, Tiririca foi usado (mas não tanto) para dar mais uma pernada na boa-fé
do povo. E hoje já não acha tanta graça de seu trabalho em Brasília: “Não levo o menor
jeito para a coisa. Já entendi como funciona, não sou bobo, mas não gosto desse jogo
de interesses. Eu não consigo ser falso assim. E aqui a sinceridade não é muito bem-
vinda”. Nem a honestidade, caro palhaço.
Valdemar da Costa Neto, seu criador, é réu do mensalão e responde a processos
por corrupção passiva, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Aliado e amigo do
peito de Lula, claro. Ao ser denunciado, em 2005, Boy renunciou para evitar a cassação
de seu mandato. Mas foi reeleito no ano seguinte em seu reduto no Alto Tietê, em que

o voto de cabresto ainda tem muita valia, como no tempo dos coronéis. Que a pena no
STF, se vier, esteja à altura de seus malfeitos para ajudar a passar uma borracha no lado
sujo da política.
Os eleitores, em vista de passado tão negro, terão um trabalho dobrado antes
de se dirigir às urnas em outubro: descobrir se seu candidato, exótico ou não, merece
realmente a distinção de seu voto: e se, por outro lado, tem um boy qualquer por
criador.

*Luciano Ornelas é jornalista da GT Marketing e Comunicação

2 comentários:

  1. Bom dia Sr. Luciano, Tudo bom?
    Eu sou estudante de Comunicação Social da Universidade Anhembi Morumbi e estamos realizando um Trabalho de Conclusão de Curso. O tema é sobre o extinto Jornal da Tarde e gostaria de saber se o Senhor poderia colaborar nos concedendo uma entrevista e se não possível neste caso poderia nos indicar algum contato conhecido que trabalhou no JT.

    O Sr. Zé Maria que te indicou.
    Agradeço a atenção e aguardo um retorno,


    Obrigada.

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  2. Olá Danyelle, por favor, deixe seu email ou telefone para que ele entre em contato, sim?

    Patrícia Martins

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